Decisão TJSC

Processo: 5064742-32.2025.8.24.0000

Recurso: Agravo

Relator:

Órgão julgador:

Data do julgamento: 2 de maio de 2023

Ementa

AGRAVO – Documento:6829659 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5064742-32.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO I – L. D. S. interpôs agravo de instrumento da decisão proferida pelo Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário nos autos da "ação revisional de juros", ajuizada contra AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, que indeferiu o pedido da gratuidade da justiça (evento 23, DOC1). Não foram apresentadas contrarrazões.  Distribuído o feito a esta relatoria, constatou-se, de ofício, vício na representação processual da parte agravante, razão pela qual foi determinada sua intimação para, no prazo de 15 (quinze) dias, regularizar a representação, mediante a juntada de nova procuração atualizada e específica, bem como de comprovante de residência da outorgante, sob pena de não conhecimento do recurso (evento 9, DOC1).

(TJSC; Processo nº 5064742-32.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 2 de maio de 2023)

Texto completo da decisão

Documento:6829659 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5064742-32.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO I – L. D. S. interpôs agravo de instrumento da decisão proferida pelo Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário nos autos da "ação revisional de juros", ajuizada contra AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, que indeferiu o pedido da gratuidade da justiça (evento 23, DOC1). Não foram apresentadas contrarrazões.  Distribuído o feito a esta relatoria, constatou-se, de ofício, vício na representação processual da parte agravante, razão pela qual foi determinada sua intimação para, no prazo de 15 (quinze) dias, regularizar a representação, mediante a juntada de nova procuração atualizada e específica, bem como de comprovante de residência da outorgante, sob pena de não conhecimento do recurso (evento 9, DOC1). Em resposta, a parte agravante apresentou manifestação no evento 17, DOC1. Retornaram os autos conclusos. É o relatório. II - Examinados os autos, verifica-se que o recurso não pode ser conhecido, porque ausente um dos pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido do processo, consubstanciado na falta de capacidade processual da parte recorrente, ante a inexistência de mandato conferido a profissional da advocacia devidamente habilitado Conforme consignado no evento 9, DOC1, a procuração acostada aos autos revela-se (i) genérica, por não conter poderes específicos para o foro e tampouco individualizar a demanda, em desconformidade com o artigo 105 do Código de Processo Civil; (ii) desatualizada, por ter sido firmada em  30/04/2024, ao passo que a petição inicial foi protocolizada apenas em 07/4/2025; e (iii) reiteradamente utilizada em diversas outras ações judiciais, conforme verificado em consulta ao sistema .  Em resposta, a agravante não apresentou os documentos solicitados, limitando-se a apresentar manifestação na qual sustenta, em síntese, que houve contato direto entre o autor e o escritório por meio de aplicativo de mensagens, que a procuração foi assinada eletronicamente via plataforma ZapSign com certificação digital válida, e que a representação processual estaria regular, apoiando-se em jurisprudência do TJSC que reconhece a validade de assinaturas eletrônicas não certificadas pela ICP-Brasil, desde que atendidos os requisitos de autenticidade e integridade previstos na legislação vigente (evento 17, DOC1). Observa-se que não há qualquer impugnação específica quanto ao caráter genérico da procuração, à sua data anterior à propositura da ação ou à sua eventual reutilização em outras demandas. Ao invés disso, a parte limita-se a defender a validade da representação processual com base em prints de conversa via aplicativo de mensagens, nos quais o autor teria manifestado interesse na propositura da ação, e na alegação de que a Portanto, a ausência de qualquer resposta quanto à regularização da representação processual ou à validade do instrumento de mandato reforça a inércia da parte quanto ao cumprimento da determinação judicial. Inicialmente destaca-se que, embora a Nota Técnica CIJESC nº 3/2022 tenha como objeto inicial a judicialização de demandas envolvendo contratos de empréstimo consignado, seu escopo e finalidade são mais amplos, voltando-se ao enfrentamento da chamada litigância predatória e da judicialização massiva de ações padronizadas, independentemente da natureza específica do contrato bancário discutido. O documento alerta para práticas reiteradas de ajuizamento de ações com petições genéricas, ausência de documentos essenciais, utilização de procurações desatualizadas e padronizadas, bem como a falta de individualização da causa de pedir - condutas que comprometem a higidez da relação processual e impõem sobrecarga indevida ao sistema de justiça. A Recomendação CNJ nº 159/2024, por sua vez, é ainda mais clara ao tratar da litigância predatória como fenômeno processual desvinculado do tipo de contrato discutido. Em seu item 1, dispõe: "Recomendar aos tribunais que adotem medidas preventivas e corretivas diante de indícios de litigância predatória, caracterizada pelo ajuizamento massivo de ações com petições padronizadas, ausência de documentos essenciais, procurações genéricas ou desatualizadas, e ausência de vínculo efetivo entre o patrono e a parte representada.” E no item 2, reforça: “Os tribunais devem exigir, como condição mínima de admissibilidade da petição inicial, a apresentação de procuração específica e atualizada, bem como a individualização da causa de pedir e do pedido, de modo a permitir o exercício efetivo do contraditório e da ampla defesa.” Essas diretrizes são aplicáveis independentemente da natureza do contrato bancário discutido, pois visam combater práticas processuais que comprometem a integridade do sistema de justiça Destaca-se, nesse contexto, a necessidade de rigor na verificação da regularidade da representação processual, da observância à boa-fé objetiva e da cooperação entre os sujeitos processuais, princípios estruturantes do processo civil contemporâneo. No caso concreto, estão presentes diversos elementos que evidenciam indícios de litigância predatória e justificam a adoção das medidas previstas na legislação processual: (i) a procuração acostada aos autos é genérica, sem individualização da demanda ou poderes específicos para o foro, em afronta ao disposto no art. 105 do CPC; (ii) o instrumento de mandato encontra-se desatualizado, datado de 2024, portanto anterior à propositura da presente ação, ajuizada em 2025; (iii) há reutilização reiterada da mesma procuração em diversas outras demandas, conforme verificado em consulta ao sistema ; (iv) a parte não atendeu à determinação judicial de regularização da representação processual, sem juntar nova procuração ou comprovante de residência atualizado; (v) a defesa apresentada não enfrenta os fundamentos processuais apontados, restringindo-se a alegações sobre a validade da Diante desse cenário, a aplicação da Nota Técnica CIJESC nº 3/2022 e das Recomendações do CNJ nº 127/2022, nº 129/2022 e nº 159/2024 mostra-se não apenas cabível, mas necessária, como medida de preservação da integridade do sistema de justiça, de contenção de práticas processuais abusivas e de garantia da efetividade da jurisdição. Inclusive, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema Repetitivo nº 1.198, firmou entendimento no sentido de que, diante de indícios de litigância predatória, é legítimo ao magistrado, com fundamento no poder geral de cautela, determinar à parte autora a emenda da petição inicial, exigindo a juntada de documentos que lastreiem minimamente as pretensões deduzidas em juízo. O referido tema foi objeto do Recurso Especial nº 2.021.665/MS, de relatoria do Ministro Moura Ribeiro, julgado em 2 de maio de 2023 pela Segunda Seção do STJ, sob a sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do artigo 1.036 do Código de Processo Civil. Na ocasião, foi fixada a seguinte tese jurídica: “O juiz, com base no poder geral de cautela, pode exigir que a parte autora emende a petição inicial com apresentação de documentos capazes de lastrear minimamente as pretensões deduzidas em juízo, como procuração atualizada, declaração de pobreza e de residência, cópias do contrato e dos extratos bancários, quando houver indícios de litigância predatória, sob pena de indeferimento da petição inicial, nos termos do artigo 330, inciso IV, do CPC.” O relator destacou que a exigência de tais documentos visa coibir práticas abusivas e fraudulentas, notadamente em demandas massificadas, padronizadas e desprovidas de substrato probatório mínimo, o que compromete a boa-fé processual e o regular funcionamento do Dentre os documentos cuja apresentação pode ser legitimamente exigida, incluem-se a procuração atualizada e com poderes específicos, especialmente quando o instrumento de mandato for genérico ou antigo, o que pode indicar ausência de vínculo atual entre advogado e parte, além de extratos bancários, cópias de contratos, declaração de pobreza e comprovante de residência. O STJ reconheceu, ainda, que a exigência de procuração atualizada não viola o disposto no artigo 105, § 4º, do CPC, desde que haja fundada dúvida quanto à legitimidade da representação processual, sobretudo em contextos de litigância predatória, nos quais se verifica a utilização de instrumentos de mandato genéricos e padronizados, sem qualquer especificidade quanto à parte adversa ou ao objeto da demanda. A tese fixada no Tema 1.198 possui efeito vinculante em âmbito nacional, nos termos do artigo 987, § 2º, do CPC, devendo ser observada por todos os órgãos do Como visto, na hipótese dos autos, há elementos suficientes que indicam a suspeita de litigância predatória, o que justifica plenamente as exigências formuladas no despacho do evento 9, DOC1, especialmente quanto à apresentação de procuração atualizada e comprovante de residência. Enfatiza-se que tais medidas encontram respaldo no entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo nº 1.198. Não obstante regularmente intimada, a parte agravante permaneceu inerte, deixando de apresentar os documentos exigidos, como a nova procuração e o comprovante de residência. Tal conduta evidencia desinteresse no regular prosseguimento do feito e impede a verificação da legitimidade da representação processual, bem como da própria existência da relação jurídica controvertida. Frisa-se que, ao invés de atender à determinação contida no despacho anterior, a parte recorrente limitou-se a apresentar petição na qual sustenta, em síntese, a regularidade da representação processual com base em capturas de tela de conversa mantida por aplicativo de mensagens. Contudo, dos referidos registros (evento 17, DOC1), é possível extrair apenas que o autor teria enviado mensagem ao escritório de advocacia após visualizar anúncio patrocinado na plataforma Facebook, o qual fazia referência genérica à possibilidade de revisão de contratos bancários. Ressalte-se que o conteúdo da mensagem não especifica quantas ações seriam ajuizadas, contra quais instituições financeiras, tampouco demonstra ciência efetiva do autor quanto aos termos da demanda ou à atuação do procurador em seu nome. Dessa forma, os documentos apresentados não comprovam a validade da representação processual. Ao revés, reforçam a dúvida quanto à real ciência e participação do autor na propositura da presente ação, especialmente diante do contexto de ajuizamento massivo de demandas com petições padronizadas e procurações genéricas. Cumpre destacar, ainda, que a utilização de anúncios patrocinados em redes sociais por escritórios de advocacia, com chamadas como “Simule agora seu caso se você fez empréstimo com os bancos Crefisa, Agibank ou BMG”, pode, em tese, configurar captação indevida de clientela, prática vedada pelo Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil. Embora não se impute, neste momento, qualquer infração de forma categórica, trata-se de hipótese que merece atenção, sobretudo quando associada a indícios de litigância predatória e ausência de vínculo efetivo entre advogado e parte. Não fosse isso, a procuração acostada com a petição inicial (evento 1, DOC2) foi assinada por meio da plataforma ZapSign, sem a utilização de certificado digital emitido nos moldes da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). Conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgInt no AREsp 2.703.385/SP, a validade jurídica de documentos processuais, como a procuração, exige a observância dos critérios estabelecidos pela ICP-Brasil, nos termos da Medida Provisória nº 2.200-2/2001 e da Lei nº 11.419/2006. O STJ foi categórico ao afirmar que não é possível equiparar assinaturas eletrônicas realizadas por meio de certificadoras privadas àquelas emitidas sob a chancela da ICP-Brasil, especialmente quando se trata de instrumento de mandato judicial. No caso concreto, a parte recorrente sustenta que a Assim, conclui-se pela ausência de representação processual válida pelos seguintes fundamentos: (i) a procuração apresentada é genérica, sem individualização da demanda ou poderes específicos para o foro, em afronta ao disposto no art. 105 do CPC; (ii) o instrumento de mandato encontra-se desatualizado, datado de 2023, portanto anterior à propositura da presente ação, ajuizada em 2025; (iii) há reutilização reiterada da mesma procuração em diversas outras demandas, conforme verificado em consulta ao sistema; (iv) a assinatura foi realizada por meio da plataforma ZapSign, sem certificação digital emitida nos moldes da ICP-Brasil, o que, conforme entendimento consolidado pelo STJ (AgInt no AREsp 2.703.385/SP), é insuficiente para conferir validade jurídica ao mandato judicial; e (v) não foi apresentado comprovante de residência atualizado da parte autora, o que compromete a verificação da legitimidade da postulação. Tais circunstâncias, analisadas em conjunto, evidenciam a ausência de elementos mínimos que atestem a regularidade da representação processual, o que impede o prosseguimento válido do feito. A ausência de regularização da representação processual configura vício que compromete o desenvolvimento válido do processo, nos termos do art. 76, § 2º, I, do CPC, ensejando o não conhecimento do recurso. Conforme lecionam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, a capacidade das partes e a regularidade da representação são pressupostos de validade do processo, cuja ausência acarreta a extinção sem resolução do mérito (CPC, art. 485, IV): "a capacidade das partes e a regularidade de sua representação processual são pressupostos processuais de validade. A falta desses pressupostos acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito (CPC 485 IV). O vício de irregularidade processual pode ocorrer em qualquer juízo ou tribunal, em qualquer grau de jurisdição e pode dizer respeito ao processo de conhecimento, cumprimento de sentença, de execução, ou mesmo de procedimento já na fase recursal" (Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 439).  A ausência de regularização da representação processual, mesmo após oportunizada a correção, impede o conhecimento do presente recurso, por ausência de pressuposto de admissibilidade, nos termos do artigo 76, § 1º, inciso II, do CPC. Caberá ao juízo de origem avaliar as consequências da inércia da parte quanto à irregularidade verificada nos autos principais, inclusive quanto à eventual extinção do feito, se for o caso. III – Nos termos do artigo 104, § 2º, do Código de Processo Civil (CPC/2015), o advogado que exerce atividade postulatória sem poderes regularmente constituídos sujeita-se à responsabilização pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios: “O advogado que abandonar a causa sem justo motivo ou que atuar sem poderes será responsável pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios, podendo ainda responder por perdas e danos.” No caso sub judice, não houve comprovação válida da outorga de mandato ao causídico subscritor da peça recursal, tampouco foi promovida a regularização da representação processual, mesmo após a devida intimação da parte interessada. Configurando-se, portanto, a atuação processual desprovida de poderes, hipótese que atrai a incidência do referido preceito legal. A doutrina é pacífica ao reconhecer que a ausência de mandato válido compromete a higidez dos atos processuais e impõe ao advogado a responsabilidade pelos encargos decorrentes da irregularidade. Nesse sentido, lecionam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery: “A ausência de procuração válida ou a atuação de advogado suspenso compromete a validade dos atos processuais, sendo nulos os atos praticados. O advogado que atua sem poderes responde pelas despesas processuais e honorários, nos termos do art. 104, § 2º, do CPC.” (Código de Processo Civil Comentado, RT, 2016) Assim, quando o advogado postula em juízo sem instrumento de mandato regularmente constituído, deve suportar as custas processuais e os honorários advocatícios, como forma de responsabilização pelo vício que inviabilizou o regular desenvolvimento do feito. Diante do exposto, condena-se o procurador  DAVID EDUARDO DA CUNHA (OAB SC045573) ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 104, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a inexistência de mandato válido, a ausência de regularização da representação processual e a nulidade dos atos praticados.  Deixa-se de fixar honorários advocatícios, uma vez que não houve triangularização processual. IV – Ante o exposto, deixo de conhecer do recurso de agravo de instrumento, em razão da ausência de regularização da representação processual, nos termos do artigo 76, § 1º, inciso II, do Código de Processo Civil. Ressalte-se que a persistência da irregularidade, imputável à parte autora, compromete o desenvolvimento válido do processo originário, circunstância que poderá ensejar a extinção do feito sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso IV, do mesmo diploma legal, a ser oportunamente apreciada pelo juízo de origem. Publique-se. Intime-se. Decorrido o prazo legal, arquivem-se os autos. assinado por LUIZ ZANELATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6829659v3 e do código CRC 77550e51. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): LUIZ ZANELATO Data e Hora: 13/11/2025, às 21:52:29     5064742-32.2025.8.24.0000 6829659 .V3 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:19:06. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas